A necessidade de se intensificar a fiscalização nos veículos que transportam cargas perigosas na BR-376 na região do Litoral paranaense foi defendida por especialistas como uma das possíveis soluções para diminuir os impactos ambientais e sociais dos acidentes com este tipo de veículo. O assunto foi discutido nesta quinta-feira (28) em uma audiência pública realizada na Assembleia Legislativa do Paraná (Alep). O objetivo do encontro foi debater a possibilidade de construção de políticas públicas que minimizem as consequências dos acidentes com cargas perigosas que acontecem com frequência na rodovia.
A audiência é uma proposição do presidente da Comissão de Ecologia, Meio Ambiente e Proteção aos Animais, deputado Goura (PDT). De acordo com o parlamentar, é necessário que programas e ações realizadas pelas diversas instituições se transformem em políticas públicas. “Dessa forma, poderemos avançar na orientação aos motoristas, na criação de lugares de descanso durante o percurso, nas condições de trabalho, na possibilidade de redesenho da estrada e em sua manutenção, na criação de áreas de escape, melhoria da sinalização, implantação de radares. Precisamos de um conjunto de medidas que tenham o objetivo de garantir a segurança no transporte, a qualidade do meio ambiente e, principalmente, salvaguardar vidas” defendeu Goura.
Acidentes
Ele lembrou ainda que os acidentes com cargas perigosas naquele trecho da rodovia resultam, muitas vezes, na contaminação da bacia hidrográfica do Rio São João, na região dos municípios de Guaratuba (PR) e Garuva (SC), comprometendo o uso das águas para consumo e lazer. “Destacamos também a pertinência de um monitoramento permanente das contaminações ocorridas, todavia, não podemos mais tentar remediar esses desastres. É urgente a tomada de ações preventivas e coordenadas para que tragédias como as vividas rotineiramente na BR 376 não se repitam”.
Segundo a Defesa Civil, entre 1980 e 2022 foram registrados 941 acidentes com cargas perigosas no Paraná, ocorridos em 171 municípios do Estado. Destes, 131 foram registrados na região do Litoral, sendo que 65 no município de Guaratuba. O Paraná é o quarto colocado em quantidade de registros no País.
O coordenador do Centro de Controle Operacional da Arteris Regional Sul, empresa que detém a concessão do trecho, Fernando César da Silva, reconheceu que a necessidade de fiscalização é o principal problema na BR-376. De acordo com o engenheiro, no entanto, os problemas são menores hoje que quando se iniciou a concessão. “Desde 2008, tivemos uma redução de 35% no número de acidentes, e de 78% no número de óbitos, mesmo com um aumento de tráfego em 60%. Em torno de 7,5% dos veículos que entraram nas áreas de escape transportavam cargas perigosas, evitando maiores problemas. O principal causador de acidentes é o condutor”, justificou.
Rodovia
Adinan Soares de Assunção, analista ambiental do Ibama, explicou que os técnicos do órgão realizaram um trabalho para identificar quais os trechos mais críticos da BR-376 e quais as necessidades para prevenção de acidentes. De acordo com ele, a maior concentração ocorre no trecho da Serra do Mar, nos 86 quilômetros entre Curitiba e a divisa com o Estado de Santa Catariana. Segundo ele, entre 2017 e 2020, o trecho entre os quilômetros 665 a 679 é o que mais concentra acidentes. Já o trecho entre os quilômetros 666 a 673 concentrou 70% desse total de acidentes. “Identificamos entre as principais causas são os problemas mecânicos, como os freios, o excesso de velocidade ou desconhecimento do trecho”, completou José Joaquim Crachineski, também analista ambiental do Ibama.
Alan Ianke dos Santos, da área de fiscalização da ANTT, informou que as ações do órgão na BR-376 vão aumentar, pois há a previsão da criação de uma Unidade Regional do Paraná da ANTT. O técnico disse que, em recente fiscalização na Serra, observou que a geometria da estrada é desfavorável. “É um trecho em que se espera que haja mais acidentes. Precisamos investigar formas de mitigar esses problemas”, explicou. Ele sugeriu a criação de um posto de fiscalização de cargas perigosas no quilômetro 645. “Podemos usar esse trecho para fiscalização de cargas perigosas. O excesso de peso é um problema e uma das causas possíveis de acidentes. Esta é uma forma de combatermos o excesso de peso e monitorar as cargas perigosas”.
Causas
O chefe do Serviço de Operações Terrestres do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT-PR), Eduardo Maksemiv Matoso, identificou outros pontos para a causa de acidentes, como a região montanhosa, a rodovia ondulada, com neblina e grande precipitação pluvial, além de um fluxo estimado em 34 mil veículos/dia. “Entre 2019 a 2022, foram registrados 1021 acidentes gerais, com 994 feridos e 63 mortes. A velocidade, o defeito mecânico e a falta de atenção representam 70% das causas. Já no trecho de Serra, 33% dos acidentes são causados por defeitos mecânicos. Destes, 36% dos acidentes envolvem veículos de carga. O tombamento representa 47% dos casos. A probabilidade de tombamento aumenta com a maior velocidade e cargas com sobrepeso”, identificou. Entre as sugestões do técnico também está o aumento da fiscalização de pesagem, principalmente de forma dinâmica, além da verificação das condições geométricas da rodovia.
O policial rodoviário federal no Paraná Ricardo Rain Schmidt reforçou a necessidade de que as empresas possam fazer cursos de direção defensiva para os motoristas, ensinando como usar o freio motor. Também lembrou a necessidade do respeito à lei do descanso e a verificação das condições do veículo. O tenente coronel do Corpo de Bombeiros da Polícia Militar do Paraná Jonas Emmanuel Benghi Pinto concordou. Para ele, algumas ações são necessárias para evitar acidentes, como a capacitação dos condutores de veículos, a necessidade do bom estado de conservação, um plano de ação de emergência para respostas, fiscalizações rotineiras, capacitação dos agentes públicos para agir em situações de acidentes, manutenção e fiscalização das vias. “O Corpo de Bombeiros promoveu a criação de núcleos para atendimentos de acidentes com cargas perigosas. O objetivo é conter os produtos para que não atinjam recursos hídricos”, explicou.
Meio ambiente
Silmara Ramos, secretária de Saneamento Ambiental do município de Garuva, revelou que em anos recentes, o trecho teve uma série de acidentes graves com derramamento de produtos perigosos, atingindo o Rio São João. “Esses acidentes resultam em fortes impactos na fauna e na flora, além de refletir na atividade econômica da cidade. Gostaríamos de algo que nos ajude no município. Não adianta fazer algo depois que o acidente aconteceu. Queremos a prevenção desses impactos”.
Erculano Radwanski, agricultor e representante da bacia do Rio São João, em Guaratuba, fez um apelo. “Toda a economia da região usa a água do Rio São João. O que vem acontecendo é que o rio é interditado depois dos acidentes e nós somos impossibilitados de usar essa água. Quando a água é liberada para se usar, vem um novo acidente. Quem vai arcar com todos esses prejuízos que os agricultores estão tendo? Precisamos de mais barreiras de contenção e de mais fiscalização de todos os caminhões que descerem a serra”, defendeu.
Marcius Sergio Albach, membro adjunto da Defesa Civil de Guaratuba, afirmou que o maior problema é a falta de fiscalização dos veículos. “É tudo falha humana, já que soltam caminhões nas estradas em más condições para trabalhar. O que precisamos é de algo imediato, com barragens de contenção para que os produtos não cheguem aos rios”, disse.
Participações
A audiência contou ainda com a participação do presidente em exercício do Instituto Água e Terra, José Volnei, do representante da Coordenadoria Estadual da Defesa Civil, major Murilo Cesar Nascimento, do superintendente do Ibama-PR, Luiz Antonio Correa Lucchesi, do diretor xxecutivo da Fetranspar, coronel Manoel Jorge dos Santos Neto, do engenheiro civil do Departamento de Estradas e Rodagens (DER-PR), Jefferson Artigas Guerra, entre outros. (Foto: IAT).