Peça desculpas, Fernandinha

Mas bastaram 50 metros de caminhada naquela cela para experimentar a rotina de um barracão de Auschwitz, Treblinka, ou coisa que o valha. 

A frase que abre minha postagem é a mesma que encerra o artigo que a atriz Fernanda Torres publicou na Folha de São Paulo de 25/8 sob o título “Treblinka”. Sempre admirei a Fernandinha, filha da Fernanda Montenegro, “a grande Dama do Teatro Brasileiro”. Adorava “Os Normais” e gostei muito do monólogo “A Casa dos Budas Ditosos” que ela fez este ano no Festival de Curitiba.

Peça desculpas, Fernandinha

Pois vejam só, essa moça visitou um presídio no Rio de Janeiro e saiu de lá horrorizada com o que viu. Será que ela imaginava que numa cidade onde falta tudo, de segurança a aspirina infantil, as cadeias fossem um cenário da Globo?

Ao fim da visita ela achou de bom alvitre escrever sobre o que presenciou. Não estava indo mal, do ponto de vista do relato factual, mas devia ter parado um parágrafo antes.

No final a Fernandinha derrapou feio e enveredou pelo caminho da estultícia, quando o termo é usado para definir pessoas que não pensam antes de falar e não medem as consequências de como suas palavras afetarão outras pessoas.

Não, Fernandinha, não há como comparar.

Por mais fortes que sejam as cenas que você presenciou, nada do que acontece lá pode ser comparado a Auschwitz, Treblinka “ou coisa que o valha. 

Aliás, Fernandinha, “coisa que o valha” foi mal, muito mal. Com isso você conseguiu piorar o que já era péssimo.

Sou judeu e a Rosane, minha mulher, é espírita. Juntos estivemos emAuschwitz, em Birkenau, em Majdanek e em Treblinka.

Nesses lugares fizemos uma regressão e quase pudemos sentir a dor das pessoas que passaram por lá. Quase pudemos cheirar a fumaça que saia das chaminés. Quase pudemos ouvir os gritos de horror, no silêncio respeitoso devido aos locais sagrados. Quase vimos a degradação e o desespero das pessoas que viveram a mais negra página da história da humanidade.

Quase dá para sentir, quase dá para enxergar, Fernandinha. Porque mesmo os atores talentosos como você jamais conseguirão passar para as plateias a representação verdadeira do que houve lá.

Reconhecer erros é bom, enobrece e faz bem à alma. Peça desculpas aos judeus, aos ciganos, aos gays, aos comunistas, aos dissidentes políticos, aos anarquistas, aos combatentes da resistência, aos testemunhas de Jeová, aos padres, aos deficientes mentais e físicos, aos sindicalistas, aos poloneses e aos outros eslavos. Reconheça o erro, Fernandinha.

Seja menos Fernandinha e mais Fernanda Montenegro.

http://www.etudoacabouemsfiha.com.br

4 COMENTÁRIOS

  1. Parabéns, Gerson Guelmann. Texto muito pertinente. Tenho somente duas observações. Primeiro, nem todos os sindicalistas eram vistos pelos nazistas como inimigos. Os nazistas criaram a Frente Alemã para o Trabalho (i.e., Deutsche Arbeitsfront, DAF) para substituir os sindicatos trabalhistas e patronais. Os sindicalistas da DAF apoiavam e eram apoiados pelo Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães (i.e., Partido Nazista). Segundo, os comunistas se tornaram inimigos dos nazistas somente após o rompimento do pacto Molotov-Ribbentrop em 1941. E tal rompimento ocorreu por disputas territoriais, não ideológicas. Em entrevista a jornalistas, Vyacheslav Molotov chegou a afirmar que “o fascismo era uma questão de gosto”. (fonte: Sheen, J. (1948) “Communism and the Conscience of the West”, p. 115).

  2. Pois eu não acho que|”Fernadinha” mereça qualquer observação, uma vez que ela já é a asneira personificada, de forma coalhada, azeda, disse bobagem, assim eu mesmo não sendo judeu, não aceito as suas desculpas, até porque creio que uma imbecilidade que flora nesse povo que se acham formadores de opinião e intelectuais ,. Pois eu fico com o Gerson Guelmann

  3. A História é sempre um caminho para que as pessoas não repitam os erros cometidos ao longo do tempo , na história moderna nada se compara ao holocausto, nada pode fazer o mundo esquecer dos horrores praticados em nome do ódio, de razões étnicas, políticas e levadas ao engodo por messiânicos que exploraram e induziram nações a essas violências inenarráveis .
    Para quem tem responsabilidades com a mídia , com a opinião pública é uma obrigação medir as palavras e letras. Pobre Fernandinha mesmo, pedir desculpas é o mínimo necessário a todos que vc elencou em seu texto brilhante.

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