Por Miriam Olivia Knopik Ferraz – Recentemente vem sendo noticiada a história de um “tomate” que foi perdido na Estação Espacial Internacional, mas a história vai muito além disso.
O astronauta Francisco Carlos Rubio, conhecido como Frank Rubio, da Nasa, possui histórico de carreira militar no Exército dos Estados Unidos, inúmeras horas de voo, doutorado em Medicina e, em 2017, foi selecionado para o Grupo 22 de Astronautas da Nasa, iniciando seu treinamento.[1]
Francisco Rubio alcançou, este ano, um recorde: o astronauta dos EUA que realizou o mais longo voo espacial, consolidando 371 dias. O recorde mundial é do russo Valeri Poliakov, com 437 dias. Este é um grande marco para a humanidade: representa a ampliação da capacidade humana de permanecer no espaço, em especial em tecnologia e investimento.
Esse marco consolidado por Poliakov e agora por Rubio traduz o real desejo do Tratado do Espaço de 1967, que inclusive foi ratificado pelo Brasil: de que a exploração espacial resulte em benefício para toda a humanidade. A ampliação da capacidade (econômica e tecnológica) de manter um ser humano no espaço por tanto tempo resulta em diversas pesquisas científicas e experimentos que podem ser avaliados em um prazo maior, trazendo novas tecnologias e impactos não somente para o futuro da Space Economy, mas para nós, na Terra.
A exploração espacial desde os seus primórdios vem resultando em diversos avanços para o nosso dia a dia, como a transmissão por satélite, monitoramento de agricultura e clima, estudos de microbiologia e microgravidade e o impacto na saúde humana dentre outros, como bem elenca a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico em diversos relatórios sobre o impacto econômico e social da Space Economy. [2]
Dessa forma, o marco de Rubio é um grande passo para a humanidade.
Mas, o que vem sendo noticiado é o fato dele ter perdido um tomate. Ele estava realizando experimentos de cultivo de tomate no ambiente da Estação Espacial Internacional e, em outubro, em entrevista a Nasa Rubio falou: “Um momento de orgulho ao colher o primeiro tomate no espaço se tornou uma ferida que eu mesmo abri ao perder o primeiro tomate no espaço”.
Aparentemente, vem sendo noticiado na mídia que houve uma “investigação descontraída” sobre o tema, até finalmente, após seis meses, nova declaração na Nasa à major Jarmin Moghbeli esclareceu que foi encontrado o tomate.
Primeiro ponto a ser abordado é que essa não é uma questão frívola, como vem sendo divulgado.
O cultivo de tomate (e outros vegetais) na Estação Espacial Internacional tem como objetivo estudar o crescimento de culturas, a composição de nutrientes, a segurança alimentar microbiana e o sabor e benefícios psicológicos para a tripulação a bordo.[3] Dessa forma, não se trata de um elemento recreativo e sim, de uma pesquisa científica.
Esse é um grande ponto: tudo que acontece no espaço gera resultados e análises científicas para, inclusive, resultarem em aperfeiçoamento das nossas vivências. O Tratado do Espaço já preconiza a abertura do espaço cósmico, da lua e demais corpos celestes à pesquisa científica, inclusive no âmbito da cooperação internacional.
Os resultados dessas pesquisas deverão ser compartilhados com toda a humanidade, o que é feito em boa parte pela Nasa. Dessa forma, “perder um tomate” é perder um resultado crucial de um experimento científico.
Por outro lado, marcar a carreira de um profissional como Rubio como apenas “aquele que perdeu um tomate” não valoriza a pesquisa científica e muito menos a trajetória deste astronauta, sombreando inclusive o seu recorde como o astronauta dos EUA que realizou o mais longo voo espacial.
Rubio exerce um trabalho de grande importância para toda a humanidade e reduzir a questão a “perda de um tomate” é reforçar os mitos que se têm sobre a exploração do espaço: como algo fantasioso e vinculado ao ego dos cientistas. O que na prática não é.
Então, nessa história há a necessidade de entender primeiro que Francisco Carlos Rubio realizou um grande feito para a humanidade e desse feito sentiremos muitos reflexos no nosso dia a dia. E quanto ao tomate, ele é resultado de uma pesquisa científica de alta relevância que pode contribuir para diversos estudos, foi perdido mas foi encontrado.
Esperamos que a Nasa amplie a divulgação de seus resultados científicos para uma maior propagação das informações que essas pessoas e esses experimentos geram em nossas vidas.
*Miriam Olivia Knopik Ferraz é advogada com tese de Doutorado em Direito Espacial do Trabalho.
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[1] https://www.nasa.gov/people/frank-rubio/
[2] https://www.oecd.org/innovation/the-space-economy-in-figures-c5996201-en.htm
3 Informações da NASA: https://www.nasa.gov/missions/station/nasa-teams-persevere-through-plant-challenges-in-space/