As celas da Polícia Federal e do complexo penal de Pinhais quebram todas as regras de convivência civilizada que a Socila – grande escola de etiqueta social que fez fama no século passado – ensinava para a elite endinheirada. Uns poucos dias, semanas ou meses de prisão são suficientes para que elas ensinem aos habitantes a romper amizades e lealdades admiráveis, a enterrar todos os bons modos.
Multiplicam-se os exemplos de que o companheirismo de outrora tem muito menos valor do que a liberdade agora. Ou, parafraseando o mote da UDN, “o preço da liberdade é a melhor delação”.
Nelson Leal Jr. é o melhor e mais recente exemplo. Após cumprir tão somente três meses atrás das grades na PF do Santa Cândida, ganhou a liberdade – graças ao “caminho das pedras” que bons advogados o ajudaram a trilhar para montar a delação que levou o Gaeco, o Ministério Público Federal e a Justiça Federal a desmontarem um dos mais sofisticados esquemas de geração de propinas que se viu no Paraná.
Nelson Leal Jr. foi o homem-chave que desvendou o esquema investigado pela Operação Rádio Patrulha, que pôs na cadeia por quatro dias o velho amigo ex-governador Beto Richa, sua esposa, Fernanda, o irmão Pepe, o primo-distante Luiz Abi e outros nove figurões do governo e do empresariado. Antes, na Operação Integração I, tinha levado à prisão gente tão poderosa quanto o ex-chefe de gabinete Deonilson Roldo, o ex-secretário Ezequias (da sogra) Moreira, o amigo-sócio Jorge Atherino e outros. Leal também forneceu informações suficientes para a Operação Integração II, que deu preventiva para Pepe Richa e confirmou a prisão de mais alguns.
Leal era leal a Beto Richa desde os tempos em que ocupou cargos de diretor (e depois titular) na secretaria municipal de Obras Públicas, no início dos anos 2000. O prefeito era Cassio Taniguchi e Beto, vice e secretário de Obras, chamou o amigo Leal para ajudá-lo a “fiscalizar” obras de pavimentação em Curitiba. Era tão leal que, quando Beto se licenciou para concorrer ao governo do estado em 2002, Nelson ficou no seu lugar.
Também trabalhava lá outro amigo, colega de escola, chamado Maurício Fanini, que veio a ser diretor na secretaria da Educação quando Beto virou governador.
O mesmo bom destino teve Nelson Leal anos depois. Ele foi chamado para ser diretor do Departamento de Estradas de Rodagem (DER), subordinado ao irmão secretário Pepe Richa. E foi ali que reuniu as mais contundentes e comprometedoras informações que escreveu e assinou na delação.
O delator ficará na história. Um dia se reconhecerá que ele mudou a política do Paraná. O efeito mais imediato foi tirar o amigo Beto Richa de uma eleição para o Senado que há poucos meses se afigurava fácil demais.