(Por Claudio Henrique de Castro) – “O Estado sou eu” é a frase dita pelo absolutista francês Rei Luís XIV (1638-1715).
Um funcionário público se recusou a usar máscara e foi multado pela Guarda Municipal da cidade de Santos– SP. Ele xingou o guarda de analfabeto, rasgou a multa e atirou-a na via pública, tudo foi filmado.
O argumento foi de que a multa foi instituída por decreto e não por lei (sic).
O Decreto 8.932 de 7 de abril de 2020 declarou o estado de emergência e calamidade pública no município de Santos e determinou o uso obrigatório de máscara nos logradouros, avenidas e praças.
Recentemente, no Distrito Federal (DF) foi impetrado habeas corpus para afastar o Decreto 40.648/20 que obrigava o uso de máscara e tal medida foi rejeitada pelo Superior Tribunal de Justiça, prevaleceu, portanto, a obrigatoriedade do uso de máscara é legal e constitucional e tanto faz que seja por decreto ou lei.
A competência constitucional dos municípios é concorrente a dos Estados e da União, portanto, o decreto da cidade de Santos é constitucional.
Porém, vamos continuar num diálogo hipotético.
Se houvesse uma lei municipal?
O argumento seria que a competência é do Estado, portanto a lei municipal não valeria.
Se houvesse uma lei estadual?
A justificativa poderia ser que a competência é federal e a lei 14.019/2020 (que obrigava o uso de máscara) foi vetada pelo Presidente no dia 02 de julho de 2020.
Mas, se houvesse a lei federal e o presidente não tivesse vetado a lei federal?
O argumento poderia ser que a matéria é exclusivamente constitucional e que lei não é maior que a liberdade constitucional do cidadão de usar ou não a máscara.
E além do mais, o STF não se manifestou ainda a respeito desse tema.
A possibilidade de lei proibir o uso de máscaras em manifestações (mas não são as máscaras contra a propagação da pandemia), está ainda em julgamento no STF (Repercussão Geral 912).
Olha quantos possíveis argumentos.
Analisei o carteiraço na obra “O jeitinho no Direito Administrativo brasileiro” e a frase “você sabe com quem está falando” é comum no Brasil, justamente para que as elites do atraso e as autoridades não cumpram as leis e fiquem impunes.
Em síntese, deem um jeitinho.
Sempre haverá um argumento capaz de afastar o cumprimento das leis e da Constituição, mesmo que ele seja absurdo ou contraditório. Veja Bolsonaro que reiteradamente descumpre as leis do uso de máscara e aglomerações no Distrito Federal e toda a negação da pandemia.
O resumo de tudo isto: no Brasil para a pequena parcela das pessoas que tem poder econômico ou governamental a expressão: “Estado sou eu”(L`Étatc’est moi) é uma realidadejurídica consolidada e atual.
Fontes:
BARBOSA, Lívia. O jeitinho brasileiro: a arte de ser mais igual que os outros.Rio de Janeiro: Elsevier, 2006.
CASTRO, Claudio Henrique de. O jeitinho no Direito Administrativo brasileiro. Curitiba: Scherer, 2011.