Em reclamação apresentada ao Supremo Tribunal Federal, o Ministério Público do Paraná (MPPR) obteve decisão favorável ao uso de informações financeiras de suspeitos previamente à instauração de investigação criminal. O caso concreto a que se refere a decisão decorre de apurações realizadas pelo MPPR em Guarapuava, no Centro-Sul do estado.
Em julho de 2021, o Ministério Público recebeu informações sobre possível atuação de organizações criminosas em Guarapuava voltadas à obtenção de ganhos ilícitos com o esquema conhecido popularmente como “pirâmide financeira”. Em consequência, foi instaurada formalmente uma Notícia de Fato e, para subsidiar as apurações iniciais, o MPPR, entre outras medidas, solicitou ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) um Relatório de Inteligência Financeira em nome dos investigados. A partir das informações obtidas, foi oferecida denúncia criminal contra os suspeitos.
A defesa dos denunciados, entretanto, recorreu ao Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, alegando que as informações financeiras não poderiam ter sido usadas como prova, uma vez que teriam sido obtidas sem autorização judicial, mediante pedido direto do Ministério Público ao Coaf, antes da instauração de uma investigação criminal formal. Entretanto, o TJPR não acolheu a argumentação da defesa, que, em consequência, recorreu ao Superior Tribunal de Justiça, conseguindo reverter nessa corte superior a decisão do TJPR. Coube então ao MPPR, por sua vez, apresentar reclamação ao STF, que, como instância final, reconheceu a validade das provas obtidas.
Repercussão geral
Decisão anterior do STF, de repercussão geral, já havia reconhecido a validade da obtenção dos dados financeiros de suspeitos sem a necessidade de autorização judicial, desde que a partir da instauração de procedimento formal. Nesse sentido, foi assim decidido o Tema 990 da Repercussão Geral (RE 1.055.941/SP): “a regra constitucional é a proteção constitucional à inviolabilidade de dados, contida no inciso XII do art. 5º da CF, que incluem também os dados financeiros, o sigilo bancário e fiscal, e a inviolabilidade da intimidade e da vida privada, que tem previsão específica no inciso X do art. 5º da CF. Mas, ao mesmo tempo em que historicamente essas inviolabilidades são protegidas, também, não há dúvida de que, seja no ordenamento jurídico nacional, na interpretação do Direito constitucional brasileiro, seja no direito comparado, os direitos fundamentais não podem servir como um verdadeiro escudo protetivo para a prática de atividades ilícitas. Não é essa a finalidade das garantias individuais, das liberdades públicas, possibilitar uma redoma protetiva para que as organizações criminosas e os criminosos possam atuar”.
Voto em tal decisão do STF esclarece que “é permitida que a iniciativa de solicitação para o compartilhamento de dados bancários e fiscais parta do próprio Ministério Público, ao fazer a solicitação para a Unidade de Inteligência Financeira (antigo Coaf) ou para a própria Receita Federal; bem como é possível, quando recebido o material informado, o órgão acusatório solicitar uma série de complementações diretamente ao Coaf ou à Receita Federal, devendo ser permitido o amplo compartilhamento, para fins estritamente penais, sem a intermediação do Poder Judiciário”.
Assim, o STF considerou que o STJ decidiu o caso de forma contrária ao entendimento firmado pela Suprema Corte e concluiu que não se verificou “a existência de nenhuma ilegalidade na atuação do Ministério Público, quando solicitou, mediante procedimento e comunicação formais, a elaboração de Relatório de Inteligência Financeira dos investigados, apontados como integrantes de organização criminosa que obtinha ganhos a partir de esquema de pirâmide financeira”. (Do MPPR; Foto:José Cruz/Ag.Brasil).