Quando os homens públicos ouvem suas próprias vozes

(por Ruth Bolognese) – Depois que o jornalismo brasileiro se tornou a mais ampla, e competente, assessoria de imprensa para o Ministério Público e para a Polícia Federal, começou a era dos “vazamentos” de gravações e grampos telefônicos autorizados pela Justiça, e que tanto estrago provocou em carreiras políticas consolidadas.

Na sequência, privatizou-se o uso do gravador no bolso do paletó, inaugurado pelo maior produtor de carne do mundo, Joesley Batista, que teve a ousadia de gravar um presidente da República dentro do próprio palácio residencial. Feito não superado em termos de invasão de privacidade institucional, mas que abriu a porteira para que gravações passassem a ser um padrão de comportamento nas relações governamentais, em todas as esferas. E os homens públicos começaram a ouvir suas próprias vozes.

Surpreendentes, destruidoras e, sobretudo, reveladoras do ambiente exclusivo por onde trafegam as autoridades da República, as gravações fornecem o argumento de credibilidade inegável para o sistema jurídico brasileiro apontar, investigar, julgar e condenar os culpados por malfeitos na administração pública.

O desconforto, no entanto, com essa nova mania nacional, é o ato em si mesmo. Trata-se, desde o princípio, de traição. E de condução da conversa, ou da obtenção da prova. Tome-se como exemplo o caso Tony Garcia x Beto Richa: ao convidar o então governador para um passeio de carro, devidamente aparelhado com um gravador, eis aí um fingidor explícito, disfarçado de amigo, que tinha a confiança do interlocutor. É um ato corajoso que exige pequenez de caráter e vácuo de ética.

E, mais complicado ainda, é o direcionamento da conversa. Ora, quem está gravando tem o controle absoluto do diálogo, para onde deve conduzir a fala e chegar à frase ou observação comprometedora. É diferente, muito diferente, de um grampo autorizado pela Justiça, onde se grava contatos de terceiros, sem qualquer interferência.

Dizer que o ex-governador Beto Richa foi traído pelo amigo Tony Garcia, no entanto, é uma meia verdade. Afirmar que o açougueiro Josley Batista atraiu Michel Temer para uma armadilha fatal é uma meia mentira.

Ambos os homens públicos abriram as portas dos respectivos palácios para pessoas capazes de conduzir uma conversa, gravá-la e entregar para a Justiça. E a capacidade adquirida para tais ousadias, tanto do bon vivant paranaense, como do riquíssimo exportador de carne goiano, foi forjada na convivência com os próprios homens públicos, os que lhes deram os caminhos certos para burlar leis, fraudar licitações, desviar o dinheiro público.

Passo a passo foram preparando o terreno para o momento estarrecedor: ouvir a própria voz numa advertência absolutamente comprometedora “tem que manter isso, viu?”, ou pateticamente reveladora como “entrou um tico-tico lá que estava atrasado”.

2 COMENTÁRIOS

  1. Essa prática de gravar não é nova não senhora.
    Desde 2002 a Polícia Federal já instalava gravadores no Tony Garcia para desvendar o Caso de Bertholdo e Banestado, segundo a Revista IstoÉ de 2006.
    É melhor verificar isso. O Tony utilizou, na época, equipamento de alta tecnologia para a obtenção das conversas. Não há qualquer ilegalidade nisso se a pessoa que está gravando seja interlocutora da conversa. O problema se dá da edição ou alteração dos contextos e frases. Muitos jornalistas também fazem isso. Por isso que reportagens investigativas, como as realizadas pelo saudoso Tim Lopes, e outros colegas, são essenciais para denunciar as corrupções. Desde que não manipuladas.
    Contra gravações e vozes não há desculpas. Basta uma pessoa ouvir e concluir.

  2. D Ruth, o que é ser radical? Para mim, ser radical é ir à raiz do problema. E sabe qual a raiz do problema politico do Brasil de hoje? 3 palavras: consórcio mídia-judiciário.

    E quem comanda o consórcio, a globo contumaz apoiadora de golpes, tem um monte de penduricalhos grudados nela que vão da sonegação fiscal, lavagem de dinheiro, e todos os delitos financeiros imagináveis.

    Quem apoiava o consórcio é a falimentar abril, que para vender revista, tornou-se a porta voz do carlinhos cachoeira que foi quem de verdade inaugurou as gravações com o esquema do PTB nos Correios, pilotado pela mesma família que hoje, de novo, esta na lista de “investigados”.

    No PR o esquema manteve o richa livre por mais de 20 anos, pois desde cedo, como demonstra o ezequiel, o negocio era mamar grana publica.

    Em todas as eleições, ate agora, a mídia, rpc na frente, sempre apoiou quem ia combater o PT e o richa navegou com o empurrão da imprensa e do judiciário parceiro.

    E o problema da impunidade cresceu tanto que o negocio passou a ser retirar quem atrapalhava ou que poderia combater a picaretagem e a Dilma ajudada pelos seus erros, pagou o “pato” (na verdade o pato foi pago com desvio de verbas da fiesp, mas isso nunca vem ao caso).

    E ai agora esta todo mundo lavando as mãos, a Sra. inclusive, como não tivesse nada com isso. Claro que tem D Ruth. A Sra. sabia de muita coisa pra se iludir e se surpreender tanto.

    O mesmo que levou o Lula a estar em cana, já que pro moro não precisa de provas, só evidencias, posso colocar na conta de todo mundo da mídia do PR: vocês sabiam e se calaram. Assim como o judiciário amigo.

    Então não chora e vota no PT pra tentar se redimir junto a quem lê a Sra. este tempo todo.

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