Os soberanos da Benjamin Constant

(por Célio Heitor Guimarães) – Sabe o leitor qual é a mais importante “autoridade” desta Terra dos Pinheirais? Suas excelências o governador do Estado, o presidente do Tribunal de Justiça ou o presidente da Assembleia Legislativa? O chefe de polícia? Sua reverendíssima o arcebispo metropolitano? Ou o reverendo pastor da Igreja Universal do Reino de Deus?

Se indicou uma das opções acima, errou. A maior autoridade no Estado do Paraná (como, de resto, nas demais unidades da federação) é o Agente Municipal de Trânsito (aqui grafado em maiúsculas para não correr o risco de ofendê-lo e deste gesto sofrer represálias). Sim, aquele indivíduo que, acoitado em pontos variados da cidade e à sorrelfa, dispara, a seu bel-prazer, autos de infração de trânsito contra os condutores de veículos.

E pouco importa se o tal motorista infringiu ou não regra de trânsito. O que importa é que o dito Agente ache que ele infringiu. E contra isso não há o que dê jeito.

Dou um exemplo pessoal, que certamente é idêntico ao de centenas de pessoas. Quem me conhece ou lê estas mal traçadas linhas sabe que não tenho telefone celular. Nunca tive e nunca terei enquanto isso for possível. Mais: odeio telefones celulares e, sempre que posso, impeço que o maldito aparelho entre em meu carro. Pois bem, em 31 de maio do ano passado, fui autuado, às 17h21m, pelo Agente 622, na Rua 24 de Maio, entre as Avenidas Sete de Setembro e Silva Jardim, por “dirigir veículo segurando telefone celular”… Sim, o telefone celular que não tenho, que não acolho em meu carro e que somente utilizo (o de outrem) em casos extremos! Mas o Agente 622 flagrou-me com ele na mão. E autuou-me pelo cometimento de infração de “natureza gravíssima”, com a aplicação de pena de multa e o registro de 7 (sete) pontos no meu prontuário de motorista, tamanha a minha desfaçatez.

Idiotamente, fiz o que o Código de Trânsito Brasileiro prescreve: recorri da autuação à Setran. Apresentei as alegações cabíveis e fiquei no aguardo do indeferimento de praxe. Ele chegou no final de janeiro deste ano: “Comunicamos que a defesa de autuação protocolizada sob nº … foi indeferida conforme fundamentação escrita no processo…”

Não me restou opção, como palhaço das perdidas ilusões, senão requerer à Secretaria Municipal de Trânsito cópia de inteiro teor do acima aludido expediente, o que fiz no dia 30.01. Fui, então, informado de que o atendimento demoraria cerca de 20 dias e que poderia ser feito on-line, chegando ao meu endereço eletrônico. Fiz ver ao atendente que o prazo final para recurso à Jari era dia 26 de fevereiro.

Como até sexta-feira 23.02, não houvesse recebido nenhuma resposta, fui pessoalmente à Rua Benjamin Constant, 157, sede da Setran. Ali, para minha surpresa, fui cientificado de que o meu pedido não poderia ser ainda atendido porquanto o processo ainda “não retornara àquela repartição” (?!), pendendo de decisão (?!). Fiz ver à atendente que a decisão já fora tomada, tanto que indeferira a minha defesa, e que o que eu precisava era conhecer os motivos para recorrer à instância superior, cujo prazo venceria na segunda-feira. Resposta da atendente: “infelizmente, o processo não está conosco” (?!); “o senhor recorra de qualquer jeito” (!). Um absurdo!

Na segunda-feira desta semana (05.03) – quer dizer, muitos dias depois do prazo – recebi pela internet as “razões” do indeferimento de minha defesa. A prestimosa analista Marinete Murcia de Andrade, em singela análise, concluiu “que não se pode dar amparo às alegações do requerente”. Isto porque “o auto de infração está em conformidade com os requisitos exigidos pelo artigo 280 do Código de Trânsito Brasileiro…” Quer dizer, dele constam “tipificação da infração; local, data e hora do seu cometimento; identificação de veículo vetor; indicação do órgão ou entidade de trânsito competente; e, informação quanto à autoridade ou agente autuador”.

E, em seguida: “A materialidade da infração foi comprovada e reduzida a termo no competente auto de infração”. Ressalta a analista que “a lavratura do auto de infração é um ato administrativo e, como tal, goza de legitimidade e presunção de veracidade, cabendo ao requerente o ônus de apresentar prova em contrário para afastar a verdade legal provisória nele inscrita”.

Então o ato administrativo goza de legitimidade e presunção de veracidade, cabendo ao apenado o ônus da prova em contrário?… Ou seja, o agente autuador, que desencadeou o ato administrativo e a punição dele decorrente, não precisa provar nada – basta autuar –, cabendo ao autuado provar a sua inocência…! Só que o que ele disser e o que argumentar em sua defesa sequer será considerado…! Afinal, o miserável é um meliante que não dispõe de “fé pública”. E, assim, todos os princípios constitucionais e de Direito são atirados no lixo… pelas próprias “autoridades públicas”.

A prática descarada se repete religiosamente, qual um mantra, há anos, através de fórmulas padronizadas e vazias, sem que ninguém tome uma providência. E as funções de agente de trânsito e de analista de defesa de autuações da Setran passam a ser as mais cômodas do mundo.

Eminente alcaide Rafael Valdomiro: bem que v. exª., tão logo se desincumba daquela obra na Praça do Japão, poderia dar uma geral na Setran. Há um descontrole perverso e nefasto naquele órgão que exige medidas urgentes. No mínimo, para que passe, enfim, a funcionar como deve, despindo-se da arrogância, cumprindo a lei e respeitando o cidadão de transita por esta cidade.

(Publicado originalmente no blog do jornalista Zé Beto)

4 COMENTÁRIOS

  1. Sinceramente eu não entendo esse pessoal qie reclama.
    Vejam só aquele “dito popular “, antigo: “A fruta não cai longe do pé”, lembram?
    Pois bem, outro dia o “pé” ao ser questionado sobre uma tentativa de assalto na UNILIVRE, ali no Pilarzinho, mais uma obra linda do Jaime Lerner, uma senhora ao apresentar sugestões ao Prefeito, sobre a segurança naquele local e em outros parques, afirmando que não dá para andar sozinha ou sozinho nesse locais, obteve uma resposta muito rápida diferente da que o Célio recebeu, e do próprio “pe” que disse e estpa escrito : “.. então é bom andar acompanhada…”
    Quem deu a resposta foi o Rafael Waldomiro Greca de Macedo, sem rodeios, sem burocracia , como sendo a solução para a segurança naqueles locais.
    Ora pessoal, a GM já tem uma unidade e das grandes lá no parque Barigui, tem no São Lourenço e ntre outros, que eu lembre tinha também no Parque da UNILIVRE.
    Será que os guardas municipais estão fazendo seu trabalho que pe da proteção dos próprios públicos, e como agora podem multar, talvez estejam deslocados para um trabalho mais nobre e de retorno financeiro.
    Assim o mesmo comportamento do alcaide se espraia pelo restante dos funcionários que não são como antigamente.

  2. Não há diferença substancial entre processo penal e processo adminstrativo quando o assunto é a instrução.

    Em outras palavras, o ônus da prova é da Administração, que é quem acusa.

  3. Eu tb, eu apertei o concluir no GPS na acyoli filho depois de deixar os filhos no Senai e levei essa multa estúpida : dirigindo e mexendo no celular. Tinha um carro da setran atrás de mim! E eu não estava no celular meu !!!

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