“Quousque tandem abutere, Catilina, patientia nostra?” (Marco Túlio Cícero).
Por Luiz Claudio Romanelli* – Seguimos gastando tempo com uma discussão sobre qual o rumo político a seguir, para esquerda ou à direita. É um debate estéril, simplório e anacrônico. De modo geral, o conceito de direita e esquerda, surgido na Revolução Francesa, está deixando de representar ideologias (stricto sensu) e passa a significar uma posição ou um lugar na sociedade. Num gesto simples é fácil apontar, em qualquer linguagem, quem está de um lado ou de outro.
A geográfica das cadeiras da Assembleia Nacional Constituinte da França de 1789, que deu origem à concepção de esquerda e direita, foi convertida em doutrinas sustentadas por teóricos dos dois lados. Não se pode negar a relevância da construção dos pensamentos que ao longo do tempo ajudaram a moldar a sociedade em que vivemos. O problema hoje é a radicalização dos discursos.
No Brasil, convivemos com o sectarismo dos dois polos. Diferenciar as posições políticas se converteu em uma ferramenta para estimular ainda mais a divisão da sociedade e a polarização de ideias e ideais. Ao meu ver, este embate entre grupos opostos sepulta aquilo que mais importa, que é colocar o País nos trilhos e resolver os problemas da coletividade.
Um extremismo de esquerda e um de direita tem em comum a antidemocracia, nos ensina o filósofo italiano e historiador do pensamento político Norberto Bobbio. Os extremos se tocam, adverte ele no livro “Direita e esquerda: razões e significados de uma distinção política”. Na obra, o escritor reflete sobre o antagonismo que anima as duas partes e também se refere ao posicionamento de centro, mais moderado, mas que pode pender para um dos lados.
O doutor em Ciência Política pela Universidade de Brasília Antônio Lassance, avalia que nem todos os atores e organizações que atuam no universo político são, necessariamente, do campo da esquerda ou da direita. Em geral, considera ele, a esquerda e direita são minoritários. Por óbvio, todos merecem ter o espaço respeitado mas o fato é que insistir apenas em dogmas não resolve a vida de ninguém.
Peguemos o exemplo da China, maior país comunista do mundo, que após a morte de Mao Tse Tung decidiu deixar de lado a luta de classes e estabeleceu como meta ser uma das nações mais desenvolvidas do Planeta. Um plano de 100 anos que está se concretizando na metade do tempo. Em função de uma nova orientação política, a China de hoje se autointitula como um regime socialista de mercado, onde impera boa dose do sistema capitalista.
Por aqui, juntar os conceitos de socialismo (esquerda?) e capitalismo (direita?) parece pecado. Veja o caso da empresária Luiza Trajano, dona da rede de lojas Magazine Luiza, recentemente classificada pelo presidente Jair Bolsonaro e seu grupo político como uma empresária socialista pelas decisões que ela adotou na gestão da empresa e o protagonismo com as causas sociais e defesa da mulher.
A cada dia fica mais evidente que devemos combater as pregações que apenas embaçam o cenário político, as Fake News criadas para confundir e desinformar, e o discurso do nós contra eles. Repetir nestas eleições o debate raso e o vale tudo para alcançar o poder pelo poder é jogar fora mais uma possibilidade de tentar construir um projeto de País.
Precisamos aproveitar as frentes de diálogo que a democracia nos abre para tentar unir os diferentes polos políticos e estabelecer prioridades comuns para iniciar a construção de um novo curso para o Brasil. Se vamos pela direita ou pela esquerda, é o de menos. Importa é iniciar a caminhada sabendo aonde queremos chegar. Mas sem histerismos.
Na minha vida pública, sou frequentemente confrontado com questionamentos a respeito das minhas posições ideológicas. Quem é da direita acredita categoricamente que sou de esquerda. Os da esquerda tem certeza absoluta que sou de direita. A todos afirmo que sou a favor do bom senso e da busca de soluções que atendam as necessidades de quem mais precisa do poder público.
Acredito que é possível construir uma sociedade mais justa, igualitária e que todos têm o direito de serem prósperas e ter as suas necessidades atendidas. Minha convicção é de que a política só tem sentido se for para melhorar a vida das pessoas. Bom seria ver ressurgir no campo político a oratória que notabilizou o Senado Romano, quando os discursos e práticas eram em razão da coisa pública e dedicados àquilo que é do interesse comum.
*Luiz Claudio Romanelli, advogado e especialista em gestão urbana, é deputado estadual e vice-presidente do PSB do Paraná