Quando Ayrton Senna morreu na curva de Tamburello, em 1994, as comunicações eram ainda precárias. A internet só começou a engatinhar no Brasil em 1995. Na época, ter um endereço de e-mail era um luxo. Os celulares só serviam para falar-e-ouvir – e muito mal. Não eram como os smartphones atuais que, da palma da mão, põem seus usuários em contato imediato com o mundo.
Talvez porque tenha partido deste mundo antes destas maravilhas modernas, o grande ídolo do Brasil, tri-campeão da Fórmula 1, precisou usar o psicógrafo do Contraponto para escrever uma carta ao seu colega automobilista Beto Richa – e com isso, sua mensagem chegou com quatro dias de atraso em relação às “500 milhas de Londrina”, em que Beto chegou em sétimo lugar, mas foi campeão na categoria C, inferior à dos grandes competidores.
Em respeito a Senna e ao governador, reproduzimos a carta:
Muito prezado e audaz piloto:
Tenho acompanhado com interesse suas performances político/automobilísticas nos últimos tempos. Seria capaz até de traçar um paralelo entre os resultados que você atingiu e a realidade das pistas de corrida.
Seu mandato tem sido como o circuito de Mônaco. Curvas fechadas, altos e baixos. Aos olhos do espectador, o grande prêmio de Monte Carlo é vistoso, como as propagandas de seu governo. Mas na realidade, os pilotos acham muito amarrado. Lento para os padrões atuais da fórmula 1.
No quesito gastos, seus governos foram como uma corrida em Dubai: exuberante. Grandioso até. Mas tudo muito artificial. Parece um cenário. Mas como os árabes sabem gastar com estilo!
No aspecto do relacionamento com os professores eu diria que você correu em Spa-Francorchamps, na Bélgica. Êta circuito enjoado e cheio de acidentes. Sempre com acidentes graves e muitos feridos. Resumindo, eu diria que sua performance, de um modo geral, foi como o GP Circuito dos Estados Unidos, disputado em Austin, capital do Texas. Foi anunciado com muita pompa, afinal os americanos têm tradição em velocidade e produzem carros admiráveis – assim como você descende de um político tradicional e admirado. Mas o resultado foi pífio. Mal organizado. Os outros pilotos consideraram-no medíocre (o grande prêmio). Vale uma reflexão.
Sei que agora você se prepara para mais uma corrida, que não são as “famosas” 500 milhas de Londrina. Parece que é um circuito maior, a ser disputado em outubro do ano que vem. Você pode ter até imaginar que tem um bom carro e que é um piloto muito bom. Mas na política e na Fórmula 1, existem imprevistos. Um eixo de barra de direção mal soldado, negócios mal explicados, delações premiadas. De repente aparece uma curva Tamburello…
Sucesso e prudência. A autoconfiança excessiva não é boa conselheira dos bons pilotos.
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Ayrton Senna da Silva nasceu em São Paulo em 1960. Foi tri-campeão mundial de Fórmula 1 em 1988, 1990 e 1991. Em 2012 foi eleito pela BBC como o melhor piloto de corrida de todos os tempos. Senna morreu durante uma corrida em 1.º de maio de 1994, no circuito de Ímola, Bolonha, Itália.
O às no volante. Campeão absoluto.