A carta de Tony Garcia

A propósito de um filmete da campanha de 1990, quando concorreu ao Senado enfrentando Zé do Chapeu, Maurício Fruet e Paulo Pimentel, o empresário Tony Garcia recupera, em carta para o Contraponto, as lembranças e decepções de um tempo em que pensou que poderia entrar para a política. O vídeo de propaganda do então candidato você revê aqui na página “Do baú“.

Meu caro Celso Nascimento.

Fui surpreendido hoje quando ao abrir o Contraponto (excelente por sinal) me deparo com algo que deixei no passado sem boas lembranças. Era muito jovem, rebelde, obstinado, não ficava em cima do muro, tinha opinião própria, tinha lado e jamais me deixei ser pautado por conveniência ou oportunismo político. A rebeldia me impedia de calar e compactuar em conchavos engendrados na calada da noite nos porões da política, tentei, confesso, mas fui vencido pelo DNA que herdei de meus pais. O que enxergava serem predicados para a vida, na política, percebi mais tarde ser PECADO MORTAL.

Passados nove anos, em 1998 me elegi deputado, não precisei mais do que seis meses para entender que não pertencia àquele lugar inóspito, desabitado por seres que deveriam ali, buscar o bem comum. Exerci os quatro anos de meu mandato em sua plenitude, investiguei, denunciei, não me curvei e não sucumbi às delícias do poder.

Ganhei alguma coisa com isso? Ganhei sim, inimigos aos montes, dentro e fora da trincheira, e por mais controverso que possa parecer, foi o que me deu forças para seguir em frente em busca da utopia que ao entrar na política perseguia. Sai da política em 2002 quando ao fim de meu mandato daquela CASA DE LEIS, nada tenho saudade, nestes quinze anos que a deixei, nunca mais lá voltei, desencarnei, os ensinamentos que lá obtive, usei-os na vida para transmitir aos meus filhos para que nunca sucumbissem à eles, pois deles, nada de bom serviria para pessoas de bem.

Vejo hoje pelos acontecimentos atuais mais que expostos, que trilhei o caminho certo e apropriado, meus filhos foram os mais beneficiados com minha atitude, seguiram caminho próprio, buscaram na formação acadêmica o que jamais encontrariam nos corredores do poder. Esta é a herança que muito me orgulho ter deixado à eles, pois a inquietude de minha alma me levou ao desprendimento das bebesses que o poder trás.

Isto não quer dizer que me tornei omisso, ao contrário, permaneço atento, pois o conhecimento que adquiri das entranhas do poder desde a época em que fui genro de Ney Braga, (com muito orgulho) uso para denunciar publicamente o que tenho convicção serem mal feitos ou falcatruas praticados por agentes públicos. O tempo passou, porém, a alma inquieta, permanece incólume.

Quanto à campanha de 1990, tive ao meu lado o fabuloso Jamil Snege, meu amigo querido desde o tempo da Múltipla onde trabalhamos juntos nos idos de 1980, ele não era um simples marqueteiro, era um sociólogo conhecedor da alma humana como poucos, sua compreensão o fazia ser uma pessoa ímpar, desprendido de vaidades, soube usar minha insolência juvenil sem me tolher em nada no que queria transmitir, e nos poucos 50 segundos que tínhamos para a propaganda eleitoral, mesmo sabendo que seria quase uma missão impossível visto um desconhecido estar concorrendo com a casta política do estado, me alçou em menos de trinta dias nos calcanhares do então vencedor na disputa o falecido José Eduardo Vieira. Se não me engano, Celso, obtive 873.000 votos, onde em 1990 havia uma só vaga a ser disputada.

Desta época a única coisa que realmente sinto muita saudade, eram os papos entre o Jamil e eu carregados de um ótimo humor e a levesa com que ele levava a vida. Aprendi muito com o Jamil, me sinto honrado pela oportunidade de ter podido conviver com ele.

TONY GARCIA

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