Biden: o alívio e a aflição. O Brasil politicamente irrelevante pela tibieza de seu governo.

“Não odeies o teu inimigo, porque, se o fazes, és de algum modo o seu escravo. O teu ódio nunca será melhor do que a tua paz.” (Jorge Luís Borges)  – 

Por Estevão de Rezende Martins* – Enfim terminou a novela da eleição nos Estados Unidos. A disputa principal era pela presidência.

Ainda haverá um rescaldo judicial, em que o perdedor tenta reverter no tapetão o que claramente perdeu no campo. A probabilidade de êxito cola no zero.

Afinal o resultado deste pleito é o alívio – Trump foi demitido pela vontade eleitoral – e a esperança de que uma boa dose de respeito e consideração volte a imperar, substituindo o maniqueísmo de segunda classe, a agressividade racial, econômica e de gênero, o ódio como método e a desgraça como fim. Nas agendas social, econômica, cultural, ambiental e internacional muito há a curar, recobrar, recuperar, sanar – como disse o presidente eleito em seu discurso na noite de sábado, dia 7. Há muito o que fazer, muito desafio a enfrentar, muita aflição a afastar.

A bipolaridade política nos EUA exacerba a aparência de irredutibilidade entre Democratas e Republicanos. Há mais tons de cinza nesse espectro do que proclamam as muitas vãs filosofias políticas que circulam por aí.

Biden é a trilha de transição entre os Estados Unidos de ontem, em que trumpistas buscavam ressuscitar a guerra civil, e os Estados Unidos de amanhã, em que Kamala Harris quem sabe se torne a 47ª. presidente, em 2024. Seria uma gloriosa vitória do mix social de um país que não tem um único autóctone territorial em posição de comando. Todos os mandatários são descendentes de imigrantes, um dia ou outro.

Um país como os EUA tem de mover-se a esperança – como o Brasil. A diferença de poderio é flagrante e o caminho a percorrer, para nós, tem ainda muito chão pela frente.

O governo brasileiro, culposa ou dolosamente, meteu-se onde não era chamado e tomou partido. Deu no que deu: tomou uma tunda. Perdeu uma monumental ocasião de ficar calado quanto à campanha e perdeu agora outra monumental ocasião de falar: oferecendo seus cumprimentos ao eleito e abrindo um novo canal de diálogo.

O ódio, o desespero, o rancor são o pior dos combustíveis: consomem e exaurem, não movem nem fazem avançar. Em política, tal coquetel venenoso é a via certa para o suicídio. Sobrou para nós ainda essa agonia.

Nos EUA de 2020, legiões de eleitores tomaram uma decisão clara: recusar o que havia, em nome do que não aguentavam mais. O que não significa que o tabuleiro de distribuição de mandatos políticos entre Democratas e Republicanos tenha sido alterado substancialmente.

Em 8 de novembro, há empate no Senado, e quase empate na Câmara dos Deputados. Isso manda um recado claro: a pedra no sapato era Trump(mesmo recebendo mais de 70 milhões de votos – mas isso é a inércia de uma eleição entre dois candidatos com máquinas partidárias bem rodadas: vota-se azul ou vermelho). Essa pedra foi posta fora. É imperativo lidar com a realidade da divisão e a necessidade da cooperação. Doutra forma, paralisa-se o país ainda mais.

Governadores, senadores e deputados precisam agora recobrar um país fraturado como há muito tempo não se via. Não importa se o mecanismo eleitoral parece vetusto, arcaico. É a forma com a qual os americanos tomam decisões. E comparecem! 145 milhões de votantes, em um país em que votar não é obrigação legal, mas um entusiasmo moral, certamente! A resposta social foi avassaladora.

Se os americanos estão diante do desafio ingente de reconstruir pontes políticas de diálogo para viabilizar o soerguimento de sua economia e de seu quotidiano, em casa, e de seu prestígio e presença no mundo, também os brasileiros se veem confrontados a um aflitivo desafio próprio: o país não é um quintal de recreação de um punhado de tresloucados que brincam de governar. O Brasil deixou de ser ouvido, não porque o mundo está surdo, mas porque o que diz não é sério.

É uma aflição ter de ficar de olho no governo federal e nos governos estaduais. Mas nossa liberdade exige uma vigilância intensa e reforçada. Não podemos ficar marcando passo por causa das intermináveis querelas de impedimentos desse ou daquele político. É melhor dispensar logo o faltoso do que ficar derrapando no pântano da inação – deixar de fazer, perder tempo com bla-bla-blá para a arquibancada prejudica, e muito: faz recuar a atividade econômica, impede combater as emergências sanitárias, agrava a pobreza, aprofunda os custos financeiros e os déficits públicos.

É desafio para cada cidadão tomar em suas mãos a resoluta escolha de banir extremos, de participar criticamente da vida pública, de não se deixar alienar por promessas vazias, de não admitir candidatos finórios, de afastar eleitos cínicos e falsos, de comparecer em massa para votar. Deu para ver o poder do voto e o efeito que tem na vida pública dos EUA. A vez do Brasil começa com as eleições municipais de 2020.

* Por Estevão de Rzende Martins, historiador, é professor emérito da Universidade de Brasília (UnB).

1 COMENTÁRIO

  1. Alguém mais notou que o huck veio visitar o moro para se articularem e aí só anunciaram à imprensa após a vitória do Biden?

    Primeiro a advogada solta a fale que não quer que o marido se meta com política, aí ele fica sumido, aí por trás dos panos monta o que ele pensa ser o caminho do meio

    O povo brasileiro tem desvio de personalidade, logo… Se Trump perder, bozo perderá também pois vamos copiar os americanos. Assim pensaram. E se Biden ganhar contamos nossas estratégia, do contrário, em bom Curitibanes, deixa quieto.

    A questão é de onde vamos tirar uma mulher negra para compor a chapa e com uma pessoa tão vaidosa quanto moro, como huck vai desenhar a composição?
    Não cabe mais ninguém em qualquer palacio que o ex juiz com. Boas intenções ocupe.

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