(por Ruth Bolognese) – Todo delator é um Joaquim Silvério dos Reis, um projeto de Joesley Batista? Quem entende do riscado, como o professor René Dotti, com 60 anos de defesa dos direitos civis nas costas, diz que delatar é libertador, no sentido da confissão da culpa, não da tornozeleira. No caso da delação que abalou os belíssimos pilares do Palácio Iguaçu, nessa semana, todos os elementos se confundem.
A primeira reação do pessoal do governo, governador Beto Richa entre eles, à delação do dono da Construtora Valor, Eduardo Lopes de Souza, foi colocá-lo na figura de um bandido em busca da redução da própria pena. Eis aí a primeira contradição: chamá-lo de “bandido” reforça o poder e a veracidade da delação, porque só um bandido seria capaz de armar um sistema de roubo de recursos públicos, sempre escassos, destinados à construção de escolas. Com mais três comparsas, o que foi o caso, tornou-se um bandido-chefe de quadrilha.
A segunda contradição é como que um “bandido” roubou mais de R$ 20 milhões de um governo, passando por cima da burocracia estatal, empenhos dos órgãos competentes e uma leva de burocratas sem ninguém barrar-lhe o caminho. Como é que botou a mão em somas tão altas, quando todo e qualquer funcionário público nos dias de hoje tem que explicar, assinar, enviar relatório para as chefias, justificar e carimbar a despesa mais elementar.
Mas vamos imaginar que o bandido-delator seja um gênio da burocracia, foi lá e roubou mesmo os recursos das escolas, ninguém viu nada e pronto. Aí um funcionário da Fundepar, unzinho só, Jaime Suniê Neto, levanta os dados e descobre que as escolas não foram construídas e o dinheiro sumiu. O funcionário perde o emprego, mas mesmo assim, “Bandido” vai preso. E, para reduzir sua pena, descreve em 25 depoimentos à polícia, com toda a riqueza dos detalhes, uma rede de contatos que ele tinha no governo Beto Richa, no alto escalão.
Uma rede composta de pessoas com cargos públicos tão importantes, que só poderia ser qualificada como uma “ilação insana” do “Bandido”. Esta expressão, diga-se, é da lavra de Beto Richa, mas para referir-se a outro inquérito policial, no Superior Tribunal de Justiça (STJ) onde se investiga se a família Richa foi beneficiada na compra de uma área na Serra do Mar.
E o “Bandido” arrasta para a lama, nessas “ilações insanas”, além do governador Beto Richa, o presidente da Assembleia, Ademar Traiano, o chefe da Casa Civil, Valdir Rossoni, os deputados Plauto Miró e Thiago Amaral, e o superintendente do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Educacional, Fundepar, Maurício Fanini. Ah, e do sempre presente nessas circunstâncias, Ezequias Moreira.
Quarta e última contradição e é do próprio “Bandido”: toda essa gente importante que ele apontou, sem ter convivido, negociado, encontrado mais gorda ou mais magra. Simplesmente deu na telha de citar os nomes para o Ministério Público Federal. Assim, pra ver no que dá.
São estes os argumentos de defesa que fizeram o governador Beto Richa entrar com uma ação na Justiça, ontem. Para que todas essas “ilações insanas” sejam esclarecidas. De uma vez por todas. E o “Bandido-delator-chefe de uma quadrilha que nunca existiu”, seja punido.
Uma carreira que fuga ao fim melancólico