O Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR) tem a prerrogativa constitucional, de, com base no poder geral de cautela, conforme jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), emitir medidas para proteger bens públicos de alta relevância, inclusive preventivamente.
Esta atribuição é a base legal da argumentação encaminhada ao Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJ-PR), na qual o TCE-PR manifesta interesse na continuidade do julgamento do Agravo no Mandado de Segurança nº 0016170-94.2021.8.16.0000.
O processo é relativo à medida cautelar emitida pela corte envolvendo o transporte coletivo de Curitiba durante a pandemia da Covid-19. Em 19 de março passado, o presidente do TCE-PR emitiu cautelar restringindo a circulação dos ônibus na capital, que deveriam manter apenas o transporte de trabalhadores da Saúde e de serviços considerados essenciais naquele momento de elevados índices de transmissão, internamentos e mortes causadas pelo coronavírus.
Liminar – A medida atendeu pedido formulado em denúncia apresentada pelo Sindicato dos Motoristas e Cobradores nas Empresas de Transporte de Passageiros de Curitiba e Região Metropolitana (Sindimoc). A entidade apontou o aumento acelerado de mortes de trabalhadores do setor, que chegava a 100 naquele momento, em decorrência da Covid. A pedido da Prefeitura de Curitiba, formulada no Mandado de Segurança, no entanto, a liminar foi derrubada pelo TJ-PR.
Na manifestação enviada pela Procuradoria-Geral do Estado ao desembargador Ramon de Medeiros, membro do Órgão Especial do TJ-PR e relator do processo, o Tribunal de Contas reafirma que a questão debatida no Mandado de Segurança relaciona-se diretamente ao exercício de suas competências constitucionais.
“A medida [cautelar] foi proferida sob a égide do poder geral de cautela de que o Presidente desta Corte de Contas viu-se compelido a valer-se para zelar, em caráter urgente, pela saúde dos profissionais representados no âmbito da Denúncia nº 160953/21, tudo qualificado por robustos relatórios de auditoria produzidos por ocasião de fiscalizações levadas a cabo pelos órgãos técnicos integrantes desta Casa”, afirma trecho da manifestação.
Desde o reconhecimento da situação de pandemia pelas autoridades de saúde, em março de 2020, o TCE-PR realizou três fiscalizações – uma auditoria e duas inspeções – que chegaram à mesma conclusão: apesar do subsídio oficial, o sistema de transporte coletivo de Curitiba não está conseguindo manter os limites de ocupação dos ônibus fixados legalmente para reduzir o contágio pela Covid-19.
Repasse – Essa situação foi comprovada enquanto vigorava a Lei Municipal nº 15.627/20, que instituiu o Regime Emergencial de Operação e Custeio do Transporte Coletivo do Município de Curitiba. Segundo o TCE-PR apurou, apenas entre maio de 2020 e março deste ano, o cofre municipal repassou às empresas que operam o transporte em Curitiba um total de aproximadamente R$ 203,5 milhões para compensar a redução no número de passageiros durante a pandemia.
Na manifestação enviada ao Poder Judiciário, o TCE-PR enfatiza que as fiscalizações que contribuíram para embasar a medida cautelar se enquadram nas atribuições constitucionais do órgão de controle externo, principalmente porque tinham por objetivo avaliar se as obrigações impostas pela Lei 15.627/20 estavam sendo cumpridas pela administração municipal de Curitiba. O repasse de dinheiro público às empresas do setor exigia, como contrapartida, a efetiva redução da lotação dos ônibus, para assegurar o distanciamento entre os ocupantes e evitar a disseminação da doença.
Competência – Por isso, o TCE-PR exerceu sua competência fiscalizatória ao auditar o sistema de transporte coletivo e expressou seu poder geral de cautela ao emitir a liminar. Esses argumentos contestam a fundamentação da decisão impugnada, segundo a qual o Tribunal de Contas estaria adstrito ao exercício posterior de fiscalização e sem poder de cunho cautelar.
Para fundamentar a contestação dessa tese, o TCE-PR cita duas decisões recentes do ministro Luiz Fux, atual presidente do STF. “À luz da jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal, os Tribunais de Contas possuem competência constitucional para determinar medidas cautelares necessárias à garantia da efetividade de suas decisões e à prevenção de graves lesões ao erário nos seus processos de fiscalização”, afirmou o ministro Fux em decisão proferida no último dia 7 de abril.
“A medida cautelar foi proferida em estrito respeito e, antes de tudo, dever de fiscalização lastreado em atribuição constitucional típica deste Tribunal e é resultado do poder geral de cautela que lhe é inegavelmente afeto, conforme já demonstrado em jurisprudência do STF”, conclui a manifestação. (Do TCE-PR).