Sobre responsabilizar empresas jornalísticas por divulgação de acusações falsas

Por Cláudio Henrique de Castro –  As empresas têm o dever de verificar a veracidade dos fatos alegados e de esclarecer o público que as acusações são sabidamente falsas. E os outros?

Três acusações com erros crassos do Ministério Público em Portugal fizeram o Primeiro-Ministro António Costa pedir demissão; num deles, houve uma confusão com o homônimo António Costa Silva, ministro da economia, na captação de conversas telefônicas.

Houve deficiência de argumentação e erros crassos nas acusações.

Até este momento, o Primeiro-Ministro demissionário é informado dos atos do processo penal apenas pelas notícias da imprensa. Onde estão o direito ao contraditório e a ampla defesa?

Nesse caso, quem será responsabilizado?

No Brasil, e as notícias que inflamaram a opinião pública em desfavor de dois presidentes derrubados por impeachment, e depois inocentados pelo Supremo Tribunal Federal?

E as operações judiciais e midiáticas que acusam, prendem e, posteriormente, são anuladas? Lembremos da lava-jato, assim como tantas outras que são anuladas, por descumprimento de atos fundamentais à validade processual.

Voltemos à decisão do STF.  O caso concreto diz respeito a uma entrevista publicada pelo Diário de Pernambuco, em maio de 1995. O entrevistado afirmava que o ex-deputado Ricardo Zaratini teria sido o responsável por um atentado a bomba, em 1966, no Aeroporto dos Guararapes (PE), que resultou em 14 feridos e na morte de duas pessoas.

O recurso ao STF foi apresentado pelo jornal contra decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que confirmou a condenação ao pagamento de indenização, considerando que, como já se sabia, na época, que a informação era falsa. Segundo a empresa em sua defesa, a decisão teria violado a liberdade de imprensa, tese que não colou.

Quer dizer, a liberdade de imprensa não acoberta falsidades e invenções.

Contudo, a todo momento são disparadas enxurradas de mentiras nas redes sociais, que não são empresas jornalísticas e estão totalmente imunes desta decisão do STF.

No julgamento, operou-se uma ficção jurídica interessante, dois ministros aposentados (Ministros Marco Aurélio e Rosa Weber) que votaram anteriormente, foram considerados num julgamento do qual não participaram nos debates finais e, em tese, se não estivessem aposentados poderiam alterar suas opiniões. Coisas da Corte.

A ementa da decisão decidiu que a plena proteção constitucional à liberdade de imprensa é consagrada pelo binômio liberdade com responsabilidade, vedada qualquer espécie de censura prévia, porém admitindo a possibilidade posterior de análise e responsabilização, inclusive com remoção de conteúdo, por informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas, e em relação a eventuais danos materiais e morais, pois os direitos à honra, intimidade, vida privada e à própria imagem formam a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas.

Na hipótese de publicação de entrevista em que o entrevistado imputa falsamente prática de crime a terceiro, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada civilmente se: (i) à época da divulgação, havia indícios concretos da falsidade da imputação; e (ii) o veículo deixou de observar o dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos e na divulgação da existência de tais indícios.

Se no decorrer da entrevista for lançada uma informação falsa? O jornalismo deverá esclarecer imediatamente o falsete e corrigi-lo? Cremos que sim.

Como no Brasil a memória histórica é curtíssima e os processos, se bem manejados, arrastam-se por dezenas de anos, poucos irão ajuizar ações para buscar essa responsabilização.

Vejamos os exemplos recentes da destruição de reputações com impactos eleitorais e pessoais que, muito tempo depois, foram desmentidos.

Em resumo, a roupa suja demora para ser lavada, passada e engomada.

Sem mecanismos processuais céleres, os prejuízos são indeléveis.

 

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