“Não tenhamos pressa, mas não percamos tempo”, José Saramago –
Por Luiz Cláudio Romanelli* – “Estamos numa estrada rumo ao inferno climático e com o pé no acelerador”. A frase é do secretário-geral Organização das Nações Unidas, António Guterres, para alertar empresários e governantes sobre o contínuo aumento da temperatura global, mesmo com os sinais emitidos pelo planeta. Ele chamava a atenção para o crescimento das emissões de gases de efeito estufa e fez uma observação impactante: a terra se aproxima rapidamente do ponto de inflexão que tornará o caos irreversível.
A verdade é que os sinais emitidos pelo clima são debatidos desde 1972, quando ocorreu a Conferência de Estocolmo. Duas décadas depois, o tema ganhou maior visibilidade na Rio-92 – ou Eco-92 -, outra assembleia realizada pela ONU para tentar formalizar uma aliança global sobre cuidados com o meio ambiente. Ali surgiu a Agenda 21, um conjunto de metas e estratégias para promover o desenvolvimento sustentável do planeta.
Mais 23 anos se passaram e foi assinado o Acordo de Paris, um tratado internacional adotado na COP21, em 2015. Seu principal propósito é manter o aquecimento do planeta “bem abaixo” de 2°C até o final deste século, e fazer os esforços possíveis para limitar a elevação até o famoso patamar de 1.5°C, na comparação com os níveis da era pré-industrial.
O compromisso foi assinado por 196 países e estabeleceu parâmetros de redução de emissões de gases de efeito estufa – Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) – e ações para fortalecer a adaptação e resiliência às mudanças climáticas, com a previsão de revisões periódicas dos progressos e das metas nacionais. Nada parece ter dado certo. Nos últimos anos, eventos climáticos severos varreram várias partes do mundo. No Brasil, a catástrofe no Rio Grande do Sul é o maior um exemplo.
Em 2023, tivemos o período mais quente já registrado. Sobre o Acordo de Paris, a ONU diz que é preciso apressar o passo para alcançar os objetivos combinados em 2015. Atualmente, em um cenário otimista, a probabilidade de limitar o aquecimento a 1,5°C é de apenas 14%. Há estudos que indicam que já passamos de 1,7°C e que até 2030 alcançaremos aquilo que deveria ser evitado até 2100: alta de 2°C sobre a média pré-industrial.
A aposta de 80% dos especialistas do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), vinculado à ONU, é de que as temperaturas realmente ficarão acima das metas do Acordo de Paris. O reflexo disso é que metade da população global vai conviver com os impactos mais frequentes das mudanças climáticas, como secas, inundações, tempestades, ondas de calor e insegurança alimentar. E o número vai aumentar enquanto as temperaturas continuarem subindo.
Tudo isso faz parte de uma série de diagnósticos que estão sendo construídos há décadas. São estudos que demonstram que a natureza não está bem. Mas não se trata de uma mazela criada por ela mesma. Trata-se de um processo de desgaste provocado pela ação do homem e que agora atinge a todos, indistintamente. Talvez nem caiba mais chamar o que estamos experimentando de “desastres naturais”. Ao cabo, são resultado da ação antrópica.
Fosse uma doença, o estágio atual do ambiente que habitamos exigiria um tratamento bastante agressivo para evitar a sua progressão, porque há uma força reagindo, à sua maneira, para se proteger de nós. E não é demais pensar que natureza, mesmo machucada, sobreviverá por milhares de anos. Em relação à sobrevivência da humanidade, não se pode fazer a mesma previsão.
De toda forma, estrago feito, está feito. Mas não podemos nos acostumar com o novo normal. O mundo exige de nós alguma redenção e muita inovação. Passou da hora de acreditar nos avisos que são repetidos há 50 anos sobre o aquecimento global e mudanças climáticas. É imperativo ignorar os negacionistas que ainda insistem em disseminar desinformação sobre o que está acontecendo.
Quem causou os estragos fomos nós, no coletivo mesmo. Agora, os bípedes inteligentes que habitam esta terra precisam, efetivamente, mudar sua postura para pelo menos remediar a confusão que fizemos. O que está posto não é apenas aquilo que a nossa geração vai enfrentar, mas o que deixaremos para as futuras gerações.
Gostemos ou não das posições da ONU, é preciso reconhecer que António Guterres foi direto e correto ao cobrar líderes globais. Para ele, é inaceitável, ultrajante e autodestrutivo colocar a questão do clima em segundo plano. Seu discurso termina com um vaticínio: coopere ou pereça!
*Luiz Claudio Romanelli é advogado, especialista em gestão urbana e cumpre mandato de deputado estadual na Assembleia Legislativa do Paraná pelo PSD.