Proposta de lei complementar para revogar a lei municipal 117/2020, que regulamenta a declaração de utilidade pública às organizações da sociedade civil (OSCs), abriu nesta quarta-feira (2) a primeira ordem do dia da sessão legislativa ordinária de 2022. De iniciativa dos vereadores Professor Euler (PSD) e Professora Josete (PT), a matéria foi rejeitada apesar do placar com maioria favorável: 17 votos “sim”, 13 “não” e 5 abstenções. A explicação é que, por se tratar de projeto de lei complementar, eram necessários pelo menos 20 votos favoráveis – o equivalente à maioria absoluta dos 38 parlamentares (a metade mais um).
A justificativa dos autores era alinhar Curitiba ao Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (OSCs), a lei federal 13.019/2014, em vigor para os Municípios desde 1º de janeiro de 2017. Com a rejeição em plenário, a iniciativa será arquivada e só poderá ser reapresentada a partir do próximo ano (sessão legislativa).
Foi consenso, durante a discussão de pouco mais de duas horas, elogios ao trabalho das organizações da sociedade civil (OSCs). Na opinião dos vereadores favoráveis à iniciativa, a revogação traria mais eficiência aos trabalhos do Legislativo e desburocratizaria o acesso das entidades a eventuais benefícios. Nos contrapontos, surgiram questionamentos sobre a alteração de leis municipais que exigem a utilidade pública e o aumento de tarefas para o Executivo.
Para Professor Euler, a extinção da análise dos títulos racionalizaria os trabalhos do Legislativo. “Foram mais de 240 projetos de lei pedindo utilidade pública na legislatura anterior. E mais de 80 projetos deste tipo em apenas um ano de legislatura. E lógico que esse tipo de projeto toma tempo de alguns setores aqui da Câmara”, declarou.
“O governo federal já fez isso há muitos anos [pela lei 13.204/2015]”, citou. “Atualmente não existe qualquer certidão ou certificação do Ministério da Justiça ou qualquer outro órgão”, afirmou. Ou seja, basta que as entidades sem fins lucrativos atendam às exigências do Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (OSCs), a lei federal 13.019/2014.
Na mesma linha, Professora Josete lembrou que o Marco Regulatório está em vigor, para os Municípios, há 5 anos. “Com a exceção das emendas parlamentares, hoje qualquer convênio [com o poder público] segue a legislação federal. E o instrumento utilizado para este convênio é o chamamento público”, completou. “Acredito que nós devemos buscar que a Câmara Municipal de Curitiba de fato aplique todo o trabalho de seus servidores e vereadores naquelas questões que são centrais.”
Amália Tortato (Novo), que já havia pedido a inclusão da matéria na pauta durante a discussão de projeto para desburocratizar a Lei da Utilidade Pública, em novembro do ano passado, lembrou que o decreto municipal 1.067/2016, para a regulamentação das emendas parlamentares, não cita a declaração. No decreto 610/2019, referente à celebração de contratos, convênios e parcerias com as OSCs, segundo ela, a utilidade pública é opcional. “A prefeitura já tem essa função hoje.”
Indiara Barbosa (Novo) reforçou os argumentos pró-desburocratização. “Claro que [a mediação] contabiliza para o vereador”, ponderou Noemia Rocha (MDB), que entretanto defendeu a revogação da lei para facilitar o trabalho das OCSs e da própria Fundação de Ação Social (FAS). “Nós estamos fazendo a função de um cartório, carimbando documentos”, comparou o Jornalista Márcio Barros (PSD). Alexandre Leprevost (Solidariedade) lamentou a votação: “Acho que foi uma oportunidade de nós mostrarmos que estaríamos andando rumo à desburocratização”. Conforme Carol Dartora (PT), faltou “vontade política”.
Questionamentos e contrapontos
“Acredito que é importante modernizarmos, desburocratizarmos todo esse processo”, pontuou o presidente da Casa, Tico Kuzma (Pros). Partiu dele questionamento sobre o vacatio legis (prazo para a lei entrar em vigor), que teve acordo para a apresentação de emenda em segundo turno, caso a proposta fosse aprovada. O vereador votou a favor do projeto, mas ratificou observações da Procuradoria Jurídica (Projuris) de que seria necessário alterar dispositivos da Lei Orgânica do Município (LOM), referente à exigência do título para isentar as entidades da taxa de alvará de localização, e da lei complementar 40/2001, sobre a alienação e o comodato de imóveis públicos.
Relator da matéria na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Dalton Borba (PDT) concordou com a apresentação de emenda para incluir no texto a vacatio legis, mas não com a alteração da LOM ou outra norma. “Havendo titulação de utilidade pública, torna-se uma exigência”, indicou. Caso contrário, disse ele, o dispositivo é considerado “letra morta” – ou seja, ocorreria a revogação tácita, perdendo sentido.
Denian Couto (Pode), que assim como Borba é professor de Direito, concordou com a análise. Comparando a Lei Orgânica à Constituição Municipal, o vereador propôs sua adequação, na sequência, para evitar “interpretações dúbias”. “O que nós estávamos tentando fazer é adequar Curitiba à legislação federal.”
“Acho que estamos jogando mais uma responsabilidade para o Executivo, que também vai ficar burocratizado”, observou o líder do prefeito, Pier Petruzziello (PTB). “A quem interessa não ter a utilidade pública?”, pontuou o vereador, que disse ter votado “não” após ouvir a opinião de OSCs. “A utilidade pública serve justamente para dar credibilidade”, argumentou. Já Serginho do Posto (DEM) justificou a abstenção porque ainda teria dúvidas sobre como ficariam os convênios com o poder público, por exemplo.