O advogado Sacha Reck, que no ano passado fez delação premiada para relatar todos os esquemas fraudulentos de licitações para beneficiar concessionárias de transporte coletivo, está pagando o preço por sua atitude: a OAB suspendeu preventivamente o exercício da profissão devido à exposição pública do acordo de colaboração.
Por ter participado ativamente dos processos licitatórios a serviço do grupo empresarial Gulin e do Sindicato das Empresas do Transporte Coletivo de Curitiba, investigados pela Operação Riquixá, sabe muito bem como ocorreram os esquemas de conluio com agentes públicos para favorecer seus clientes. Direta e pessoalmente envolvido (e não apenas como advogado), chegou a ser preso e se tornou um dos reus da Riquixá, instaurada pelo Ministério Público.
Graças à sua delação, já foram desmanteladas as fraudes e identificados os responsáveis em Guarapuava e Paranaguá, e agora o MP mira a licitação de 2010 para a concessão dos serviços em Curitiba – na qual, de novo, teria sido beneficiado o grupo controlado pela família Gulin.
Sacha escreveu uma carta pública para expor seu drama pessoal e profissional. Mas diz não estar arrependido de sua decisão de fazer a delação. Está arrependido, apenas, de ter participado dos esquemas fraudulentos. Leia a íntegra da carta:
Arrepender-se de erros cometidos, reconhecê-los e corrigi-los são lições que se aprende desde criança. Quando se é pequeno, muitas vezes basta um pedido de desculpas, ainda que não muito sincero, que tudo está resolvido. Em outros casos, a condição de criança é garantia de uma tolerância ou de pelo menos uma segunda chance. A grande diferença de ser adulto é perceber que, quando se erra adulto, não há mais essa benevolência das pessoas, e temos que aceitar as consequências de nossas atitudes e de nossos erros.
Em artigos anteriores, eu fui muito sincero – e continuo sendo – em reconhecer que cometi erros na minha profissão, que estou muito arrependido e envergonhado do que fiz, e que quero reescrever a minha história de uma maneira totalmente diferente. Mas tenho – e sempre tive – a consciência de que isso não me deixaria isento de sofrer as consequências dos meus atos e das minhas escolhas.
Já é público que eu escolhi firmar um acordo de colaboração premiada com o Ministério Público, mesmo em liberdade, após Habeas Corpus concedido pelo Superior Tribunal de Justiça. Essa escolha também implicou sacrifícios. Meu escritório de advocacia se esvaziou. Todos os meus sócios se retiraram, por razões que eu compreendo e aceito, sem mágoas. Minha advocacia está se desfazendo lentamente. Apesar dos meus esforços e da minha esperança, os clientes sumiram. Afinal, com tudo o que gira em torno de mim, certamente as pessoas devem preferir outros profissionais antes de me procurar. Eu agiria da mesma forma, sendo muito sincero.
Na semana passada, soube que a OAB/PR decidiu suspender preventivamente o exercício da minha profissão, devido à exposição pública do meu acordo de colaboração premiada. Claro que, num primeiro momento, eu recebi essa notícia de forma não muito positiva. Recorri ao Poder Judiciário e consegui ao menos manter o direito (essencial) de advogar em causa própria nas ações penais que foram movidas contra mim, ficando impedido, porém, de advogar para qualquer cliente.
Após muita reflexão, e muito embora eu vá me defender e buscar um julgamento de mérito justo e adequado do processo pela OAB/PR, tenho que admitir que essa suspensão também é consequência das minhas escolhas, com o que eu terei que conviver e lidar daqui pra frente.
Se alguém me perguntasse: será que valeu a pena eu escolher admitir todos os erros, arrepender-me deles, pedir desculpas públicas, se nada disso bastou para evitar todas as punições que a vida me trouxe? Sim, eu responderia. Valeu a pena. Estar ao lado dos meus filhos, da esposa que é minha alma gêmea e dormir com a consciência tranquila vale o preço!
Sacha Reck