No tempo em que votar em macaco era protesto

A invenção da urna eletrônica foi a grande salvação dos políticos. Estivéssemos ainda no tempo que se depositava cédulas de papel em urnas de lona grossa, a desilusão generalizada de que sofrem os eleitores com a classe política, não importando o partido, mostraria sua cara de outro jeito, bem mais feia e constrangedora, como acontecia em eleições de antanho.

Em 1988, por exemplo, nas eleições municipais do Rio de Janeiro, o grande “vencedor” foi o macaco Tião, simpático e esquizofrênico habitante do zoológico carioca que, embora não fosse filiado a partido algum nem tenha se candidatado a qualquer cargo, recebeu mais de 10% de todos os votos. E olha que sua campanha foi pobre, incentivada apenas como galhofa em programas humorísticos da televisão e em jornais alternativos satíricos.

Os eleitores, em vez de marcarem nos quadradinhos dos candidatos oficiais ou escrevem nome ou números, registravam seu protesto escrevendo na cédula o apelido do macaco Tião, dado em homenagem a São Sebastião, o padroeiro do Rio de Janeiro.

A urna eletrônica veio para acabar com esta “festa”. Agora, as formas mais visíveis de protesto são a abstenção, o voto branco e voto nulo.

As mais recentes eleições, sucessivamente, foram mostrando índices cada vez maiores de absenteísmo e de não-voto. Em Curitiba, por exemplo, no última eleição para prefeito em primeiro turno, mais de um quarto dos eleitores (28%) decidiu que nenhum dos candidatos merecia seu voto. Em números absolutos, 360 mil curitibanos deixaram de votar. Note-se que o primeiro colocado, Rafael Greca, teve menos votos, 357 mil.

Olhe-se este fenômeno de modo mais amplo: o povo sentiu que a política em geral não merecia sua participação.

Apesar de toda a crise ética em que se afundaram os políticos, os governantes, as instituições; apesar da realidade sombria da economia; do desemprego maciço; da falta de horizontes – as ruas estão vazias. Já não se batem panelas, camisas vermelhas ou amarelas desapareceram; bandeiras não se agitam; patos e pixulecos perderam encanto; coxinhas e mortadelas já não definem os contrários.

A desilusão é geral e não será espantoso, diante da maioria dos candidatos que aí estão, tanto para presidente como para governador, se se repetir o não-voto.

Sorte que a urna é eletrônica. Falta um “macaco Tião”, embora sobrem “capivaras”, para simbolizarem o descontentamento dentro da urna.

 

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